terça-feira, 30 de março de 2010

 





ÀS DEZESSETE HORAS DO DIA 31 DE MARÇO DE 1964, FEZ-SE O GOLPE.

Às vésperas de completar mais um “aniversário”, daquele que é considerado um período cruel da história do Brasil – a época da ditadura – a mídia ainda se ocupa com exibição de “realities shows”, o que é lamentável.
Para mim, que não participei da época da ditadura, por ser muito pequena, mas que, no entanto, vivi o clima em casa de uma visão amedrontadora imposta por meu pai, Coronel do Exército, e uma mãe aos moldes tradicionais - passiva e fragilizada, foi muito desconfortável tomar contato, depois que tinha idade o suficiente, com fatos passados naquele período vergonhoso da História desta Nação, em nome da Segurança Nacional do País.
OS VERDADEIROS FILHOS DA PÁTRIA PELA DEMOCRACIA


Numa ocasião, lembro-me de ter sido a única que foi dar as boas-vindas a uma professora querida que retornava das "férias antecipadas". Seu olhar parecia apreensivo, assim, de quem sabia que a qualquer momento poderia ser hostilizada. Seu sorriso era tímido. Como se não houvesse lugar para sorrisos. Lembro-me da cara das professoras e pais de alunos cochichando "ela é subversiva”, “piranha comunista”. Então, como se fosse hoje, vejo a imagem da diretora, grande mestra, decidida e forte, Sra. Isa Freitas, da Escola Roma, “reintroduzindo” a colega, com respeito e carinho que merecia. E mais uma vez, eu, criança, olhava e admirava aquela mulher que enfrentava todas aquelas pessoas ali presentes, donas de suas salas, falso-moralistas. Ela falou, de improviso, sobre valores e respeito, como resposta àquela gente. Apesar de ter algo estranho no ar, eu fiquei foi feliz por rever minha querida professora naquele dia. E na minha cabecinha de criança a palavra – subversiva - ficou martelando.
Cheguei em casa e perguntei à minha mãe o que queria dizer aquela palavra. E sabe qual foi a resposta? "Não fala esta palavra, menina! que horror"! Naturalmente, ela comentou com meu pai mais tarde. E eu, naturalmente, fui punida pelo meu pai, apesar de minha tentativa, inútil, por tentar esclarecer alguma coisa. Naquele momento eu senti o peso da incompreensão, injustiça na própria pele. Não entendi porque estava sendo punida. Ouvi quando meu pai xingou a diretora da escola e a professora dizendo que eram comunistas. Parece que era comum xingar uma mulher, que não fosse “AMÉLIA” de “piranha comunista”.
COMUNISTAS COMEM CRIANCINHAS


Paga-se sempre um preço por ser/pensar diferente. É claro que pessoas mais informadas não podiam engolir ou aceitar aquela historinha encomendada de que comunistas iriam forçar famílias a dividirem seus bens, que comunistas comiam criancinhas e que todos, não poderiam emitir opiniões ou idéias que fossem contrárias ou diferentes daquelas que estavam sendo impostas. Medo e censura se instalou. Atitudes invasivas eram tomadas em nome da Segurança Nacional. Letras de músicas foram censuradas, peças teatrais, leituras de livros de filosofia, enfim, todos estavam sob suspeita de estarem cometendo atos subversivos.
E movidos pela crença de livrar o País das mãos dos comunistas foram cometidos assassinatos, torturas e desaparecimento de muitos jovens estudantes, professores, artistas, intelectuais, pessoas comuns etc.
RESGATE DA HISTÓRIA

É necessário que haja punição civil e penal para os militares que torturaram e mataram. Pois é inconcebível a anistia concedida a todos os militares e policiais, sem individualização das ações criminosas, consideradas positivas e justificadas a partir do princípio implícito do caráter excepcional de “guerra justa” em defesa das instituições. Não podemos mais ter assuntos proibidos. Os militares são não intocáveis. Devem assumir por seus atos, ser julgados e condenados por seus crimes. Os familiares dos desaparecidos políticos e ex-perseguidos políticos, e o povo brasileiro merecem mais do que um pedido de desculpas oficiais, têm o direito de exigir a abertura completa dos arquivos da ditadura.

É importante que haja um resgate e reflexão da história do Brasil promovendo-se debates nos vários setores da sociedade, promovendo uma discussão democrática, sob moldes de uma sociedade que luta por uma democracia justa, composta por cidadãos conscientes, que exercem, de fato, a cidadania.
É preciso que essa página da história do Brasil, a época da ditadura militar, seja conhecida, discutida junto com as novas e futuras gerações para que torne-se memória viva e jamais caia em esquecimento. Para que absurdos como esse não se repitam. E que nomes de ditadores não sejam mais utilizados de maneira leviana, ofendendo diretamente e permanentemente aos resistentes da ditadura, suas memórias e de duas famílias, de todo democrata, brasileiro ou não. Não é admissível que criminosos políticos e civis sejam “celebrados” ou homenageados tendo, de forma particular ou pública, seus nomes dados a pontes, avenidas, ruas, colégios, escolas públicas, cartórios etc como se fossem heróis.
É importante que haja uma política voltada para educação, para valores humanos, éticos. Uma sociedade justa só existe a partir de cidadãos conscientes de seus direitos e deveres. Conscientes de que estão inseridos dentro de uma diversidade cultural que precisa ser reconhecida e respeitada. Só assim, a discriminação, o racismo, os preconceitos diversos desaparecerão. Enquanto reinar a disseminação de valores invertidos e deturpados, a impunidade e injustiça ainda persistirá por longas datas.

Comentários:
Tinha 14 quando a ditadura foi instalada. Estava num colégio salesiano, internado.
Com 18 saí do Brasil como muchileiro, idéias hippies na cabeça. Bem, nunca determinei a extenção do problema, embora tivesse contatos esporádicos, como vc.

Penso o seguinte, Syla: não estou atento sòmente às questões políticas, pela simples razão de que: enquanto não se fizer uma reforma 'humana' (que creio está em andamento), qualquer outra será inócua.
De lá pra cá muitas coisas mudaram graças a que: a 'consciência'.
Concordo com vc neste ponto e vou além: ela é a base de tudo. Tendo consciência de si, o ser humano verá os outros com quem divide o planeta.
Terá consciência de suas responsabilidades.

É nisso, basicamente, em que acredito.

Bjs!
 
Eu vivi essa perseguição. De 1968 a 1970 eu tentei participar de festivais de música - eu escrevia as letras - e sempre fui censurado.
Que eu me lembre não havia nada de subversivo em meus versos. A única coisa que eu pretendia era viver num mundo sem guerras, sem injustiças sociais e com liberdade...
Parabéns pelo blog.
 
Agradecida pelo depoimento e pelo elogio.
 

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